A síndrome de Tourette é conhecida pelas crises de ações involuntárias,
como pestanejar e esticar o pescoço. De causa desconhecida, o distúrbio
neuropsiquiátrico que costuma surgir na infância intriga cientistas. Um
grupo do Reino Unido acaba de divulgar resultados de uma pesquisa que
pode tornar o tratamento para o problema — que, em alguns casos, envolve
a ingestão de antipsicóticos — menos agressivo. Eles descobriram níveis
altos de um importante neurotransmissor em uma área do cérebro
responsável pelos comandos motores. A proposta é utilizar ondas
eletromagnéticas para estimular as áreas cerebrais afetadas por esse
problema.
“As operações normais do cérebro dependem de um equilíbrio das influências inibidoras e excitatórias nos principais circuitos dele. Pensamos que, na síndrome de Tourette, esse equilíbrio é perturbado dentro de uma área conhecida como estriado, fazendo com que o processamento se torne desorganizado”, explica ao Estado de Minas Stephen Jackson, um dos autores do estudo e professor da Universidade de Nottingham.
Para decifrar como a área do estriado funciona quando há a síndrome, os cientistas utilizaram uma técnica avançada de monitoramento cerebral e compararam os resultados atingidos com voluntários saudáveis e pacientes com Tourette. “Usamos uma técnica chamada de espectroscopia por ressonância magnética, utilizando um escâner para medir a concentração no cérebro de alguns neurotransmissores, substâncias químicas que refletem a atividade desse órgão”, detalha Jackson.
Os cientistas constataram níveis significativamente maiores de ácido gama-aminobutírico (Gaba), um neurotransmissor inibitório do cérebro, na área motora suplementar dos pacientes com Tourette. O Gaba tem como função inibir as atividades motoras do corpo. Caso esteja em maior quantidade, acreditam os pesquisadores, poderia auxiliar a controlar as crises de Tourette.
“O papel dele no cérebro é inibir a atividade neuronal, parar as células, evitando que elas disparem. Se estimulados, poderiam amortecer a hiperexcitabilidade nas áreas corticais do cérebro que produzem o movimento. Ao reduzir a atividade excitatória nesses locais, daríamos às pessoas que sofrem com essa síndrome um maior controle sobre os movimentos voluntários e, consequentemente, menos tiques”, explica Jackson.
Suspeita confirmada Ana Hounie, psiquiatra especialista na doença e supervisora do Ambulatório de Transtornos do Espectro Obsessivo Compulsivo da Unidade de Psiquiatria da Infância e Adolescência da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), explica que já existiam suspeitas de que os níveis de Gaba em pacientes com a síndrome pudessem ser irregulares. O trabalho dos pesquisadores do Reino Unido, segundo ela, traz mais dados que reforçam essa hipótese e também podem explicar a melhora apresentada por alguns pacientes quando envelhecem.
“Com esse estudo, podemos trabalhar com uma teoria de que, à medida que você envelhece, os níveis de Gaba aumentam e, por conta disso, esses tiques diminuem”, diz Hounie. “O Tourette não tem cura determinada, mas, quando ela ocorre, em um terço dos casos, acontece de forma espontânea e na vida adulta. Acreditamos que isso ocorre pelo amadurecimento do sistema neurológico.”
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