Sr. Mario Bernardini, engenheiro e membro do Grupo Reindustrialização. |
O
fim do processo de impeachment, ao contrário do que sido apregoado, não
deverá alterar sensivelmente o “modus operandi” do governo, que
continuará suscetível a pressões e sujeito a uma contínua negociação com
o Congresso. Este comportamento decorre, mais do que da interinidade ou
não do governo Temer, da mudança do comportamento dos deputados que,
historicamente, fazem parte do baixo clero e que, após Eduardo Cunha,
acordaram para o poder que detêm e passaram a usá-lo, cientes da
capacidade de pautar o Congresso, à revelia do governo.
As
dificuldades em avançar, tanto na limitação dos gastos como na reforma
da Previdência ou na modernização das relações capital- trabalho,
deverão continuar presentes e até aumentar em função das próximas
eleições municipais e, principalmente, da sucessão presidencial.
Simplificando, o PMDB quer fazer bondades para se reeleger em 2018,
enquanto o DEM e o PSDB querem que faça maldades para carregar o ônus e,
assim, sair do páreo e entregar o país para eles, razoavelmente
ajustado, em 2018.
A
baixa sensibilidade da equipe econômica com os problemas do setor
produtivo faz com que, em vez deste ser visto como parte indispensável
da solução, seja encarado, na maioria das vezes, como fazendo parte do
problema. Há uma crença quase religiosa de que o ajuste das contas
públicas resolve praticamente tudo e o crescimento econômico virá como
uma simples decorrência.
Sem
querer diminuir a importância dos erros cometidos e da incompetência do
governo Dilma no agravamento da crise, é necessário destacar que os
novos detentores do poder, na realidade, de tanto repetir uma leitura
extremamente simplificada de suas causas acabaram acreditando no
discurso de que todos os nossos males decorrem do abandono do “tripé
econômico” agravado pelo excesso de gastos do governo e consequente
desequilíbrio fiscal.
Não
atentaram, até agora, na importância do fato de as empresas e famílias
estarem crescentemente endividadas, passando de 35% do PIB em 2005 para
mais de 75% do PIB em 2015 numa economia que começa a perder fôlego a
partir de 2011. De fato, a partir daquele ano, as empresas perdem
margens de forma contínua chegando a praticamente zerar sua
rentabilidade a partir de 2013 em função do baixo crescimento e forte
elevação das despesas financeiras.
O
ajuste cambial que permitiria, à indústria, uma saída alternativa para a
recessão interna foi jogado fora, mais uma vez, em nome do combate à
inflação que, por não ser uma inflação de demanda, resiste teimosamente a
taxas de juros extremamente elevadas que agravam ainda mais a situação
dos consumidores e das empresas. O ministro Meirelles chega a afirmar
que o Real apreciado favorece os investimentos, o que não faz sentido
para o setor produtivo.
Na
realidade, o Dólar baixo tem o efeito oposto. Ele reduz o preço dos
produtos importados que concorrem com os produtos nacionais, estabelece
um teto no preço de nossos produtos independente de custos crescente, o
que significa redução ou eliminação de margens, e impossibilita a
exportação, pois o preço do produto brasileiro sobe em Dólares para
garantir ao exportador os mesmos Reais. É óbvio que, nestas
circunstâncias, investir em produção é um contrassenso.
Haverá
sempre quem defenda que a competitividade não depende exclusivamente do
câmbio, o que, “strictu senso”, é correto, mas, no mundo real, ganhos
de competitividade na área sistêmica, ou seja, em infraestrutura,
reformas trabalhista e tributária, educação, segurança jurídica... vão
continuar na lista de desejos por muito tempo ainda, enquanto que ganhos
de produtividade, que são da alçada das empresas, dependem de
investimentos, ou seja, da existência de margens adequadas e, portanto,
de um câmbio competitivo.
Sem
medidas que favoreçam a redução do endividamento da indústria e a
recuperação de suas margens, via financiamento a custos compatíveis com o
retorno das empresas e câmbio competitivo, não haverá possibilidades de
aumento da arrecadação e, portanto, de ajuste das contas públicas pelo
lado da receita. Há, ainda, riscos maiores com relação a nosso parque
industrial. A indústria de transformação, por exemplo, estará reduzida,
em fins de 2016, à metade do que era há pouco mais de dez anos, com o
consequente agravamento do processo de desindustrialização e da perda de
importantes elos da cadeia produtiva.
É
fundamental, portanto, sensibilizar o governo de que as medidas capazes
de estimular a retomada do crescimento econômico como a redução da
Selic e das taxas de juros de mercado, a regularização do crédito, a
adoção de uma política cambial que favoreça a manutenção de um câmbio
competitivo e com baixa volatilidade e a aceleração do programa de
investimentos em infraestrutura têm que ser implementadas
simultaneamente com o ajuste fiscal e com as indispensáveis reformas
previdenciária e trabalhista.
*Mário
Bernardini é engenheiro e diretor de competitividade, economia e
estatística da ABIMAQ – Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e
membro do Grupo Reindustrialização
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