A Lava Jato, que já foi um grande fator de instabilidade no governo Dilma, está cumprindo (e vai continuar assim) o mesmo papel turbulento no governo Temer, que conta com igual ou maior número de barões ladrões (donos cleptocratas do poder) envolvidos com a corrupção e o patrimonialismo nacionais.
A Lava Jato está apurando casos escabrosos de corrupção nas cúpulas dos governos cleptocratas recentes. A instabilidade gerada por ela não se relaciona só ao que já sabemos (ao que já foi divulgado). O terrível é o que ainda não se sabe ou que ainda não foi divulgado.
Por exemplo: todas as delações da Odebrecht (mais 76 devem ser divulgadas depois da homologação); cerca de 40 delações da Camargo Correa; milhares de contas bancárias já liberadas pela Justiça Suíça; as investigações dos EUA e do Ministério Público da Suíça; as novas Lava-Jatos (operações congêneres), como a que investiga a corrupção da Caixa Econômica; eventual delação de Eduardo Cunha etc.
A desonestidade, por si só, diante do nível de tolerância institucional com a corrupção, dificilmente derruba um governo no Brasil. Não derrubou os governos de Ademar de Barros ou de Paulo Maluf, por exemplo. Mas se ela se une a outros fatores (crise econômica, crise política, protestos populares, reação firme do Judiciário etc.), passa a ter muita relevância.
Com Dilma e Collor, ambos sofreram o impeachment, muitos fatores (dos alinhados abaixo) concorreram concomitantemente. Nesse cenário não há governo que se sustente. Mesmo com praticamente todos os fatores desfavoráveis, mesmo assim, as elites dirigentes demoraram pelo menos seis meses para “preparar” o novo presidente (Itamar Franco e Michel Temer).
Lula esteve na iminência do impeachment em 2005, quando explodiu o escândalo do mensalão. Não caiu porque vários fatores decisivos (apoio das elites dirigentes, apoio popular, economia crescendo, melhoria nas condições socioeconômicas da população, base parlamentar suficiente para sustentá-lo etc.) o seguraram.
O que as elites e o clube da cleptocracia querem é um cenário de boas expectativas (e “corretas” medidas econômicas) para seus “negócios”. A população, para elas, não conta. Se os protestos chegarem ao nível de uma comoção social, elas colocam o Exército nas ruas, matam algumas pessoas e tudo se controla.
E o que pode ocorrer com o governo Temer?
A consultoria Macroplan, empresa especializada em estratégias e estudos prospectivos (do economista Claudio Porto), fez um estudo sobre a perspectiva do governo Temer (ver. M. Pereira, O Globo, 14 e 15/1/17). O cenário predominante em jan/17 é de sucesso parcial do seu governo, com chance de terminar o mandato.
Aos fatores reputados relevantes pela Macroplan nós agregamos outros. Numa cleptocracia instável como o Brasil, com crises múltiplas concomitantes (econômica, política, ética, social etc.), no entanto, é impossível traçar um quadro completo. A imprevisibilidade é a regra.
FATORES | PREVISÃO (Marcoplan + minhas observações) |
Economia e medidas econômicas | Dois anos turbulentos (2017-2018), com alta volatilidade e reduzida previsibilidade, especialmente este ano. Se a China voltar a comprar as commodities brasileiras o quadro melhora. A intensidade dos protestos contra tais medidas é fator desestabilizador. |
Confiança dos mercados econômico e financeiro (elites dirigentes) | Depende da economia e da base parlamentar de sustentação. Se Temer perder o controle do Congresso sua permanência no governo se complica. As elites são as que comandam as sucessões presidenciais. Qualquer paralisia decisória de Temer pode tirá-lo do poder. Se suas expectativas econômicas se frustrarem, Temer será retirado do poder (a ação no TSE é o grande trunfo). Novo cenário de “sarneyzação” não seria tolerado. |
Apoio do Clube de Cleptocracia (dos barões ladrões, envolvidos com a corrupção e o patrimonialismo). | Os barões ladrões querem roubar cada vez mais. Eles, em regra, se revezam em cada governo. Estão sendo atacados pela Lava Jato e o governo não tem conseguido “estancar a sangria”. Isso gera insatisfação. O sonho máximo do clube é um “anistião” geral. |
Apoio do Legislativo (base parlamentar de sustentação). A eleição de Eunício no Senado, Renan para a CCJ, Jucá para a liderança, Maia na Câmara (todos, junto com Temer, citados nas delações da Odebrecht etc.) é fundamental para a preservação parlamentar da cleptocracia. | É a peça-chave no governo Temer. Até aqui tem funcionado conforme suas conveniências. Se falhar, seu governo corre risco de não terminar, porque os ataques da Lava Jato serão intensos. Sem base parlamentar novas medidas econômicas não serão aprovadas (isso afeta a confiança das elites). Um quadro de ingovernabilidade põe fim ao mandato de Temer. |
Apoio do Judiciário (STF) | O STF, se não mudar de postura, já deu sinal inequívoco (no seu apoio ao Renan, dia 7/12/16) de que pode assumir definitivamente seu papel de clepto-conivente com a roubalheira institucionalizada. Contra o PT o STF foi duro, mas em relação aos outros partidos parece bastante flexível. Aguardemos. |
Apoio da Grande Mídia | A grande mídia, em regra (há exceções honrosas), segue a cartilha (os humores e os temores) do capital econômico e financeiro. Quando as elites deliberam a queda de um presidente, em poucos dias ela o destrói completamente. |
Governo de Donald Trump | Fator de muita preocupação, sobretudo na economia. Suas medidas nacionalistas poderão ser um golpe na globalização econômica. México será, desde logo, o grande prejudicado. |
Crise na segurança pública/sistema carcerário | Medidas imediatas concretas devem ser tomadas para tranquilizar a população. A velha política populista de agravamento das penas entrou em colapso. De 2004 a 2015, 19 dos 27 Estados tiveram aumento na criminalidade; a cada 9 minutos mata-se uma pessoa no Brasil. Nossa violência não é conjuntural, sim, estrutural (só pode ser eficazmente atacada com medidas estruturais). |
Eventual Estado de Defesa ou de Sítio (intervenção militar a pedido do PR) | Essa intervenção militar é pontual, diante uma comoção social. Não significa que os militares vão assumir o poder. |
Desonestidade/honestidade | A Lava Jato, com mais de 3 milhões de dados armazenados, já está disparando sua artilharia pesada também contra o governo cleptocrata do Temer. Não será tarefa fácil escapar desses bombardeios. As tensões políticas tendem a se agravar. Algumas lideranças serão aniquiladas. |
Apoio/descrédito popular | É baixíssimo o índice de popularidade de Temer (perto de 10%). Mas seu governo não se sustenta na democracia, sim, na plurocracia (suas medidas estão voltadas aos interesses dos poderosos econômicos e financeiros). |
Golpe militar (comandado pelas elites dirigentes) | Todos os golpes militares no Brasil não foram decididos pelo povo, sim, pelas elites dirigentes. Seus negócios e seus bens são o mais importante. Se para isso for necessário um golpe militar, eles farão isso. Mas a improbabilidade é imensa neste momento. |
Cassação da chama Dilma-Temer no TSE/STF (todas as decisões do TSE são recorríveis ao STF). | Essa decisão será altamente politizada. É o grande trunfo das elites dirigentes. Se for preciso trocar o governo, cassa-se a chapa (mas isso só acontece se um nome estiver pronto para assumir). Se as elites quiserem a manutenção do governo, a cassação não sairá (ou não sairá a tempo de se fazer nova eleição). |
Voto Faxina (nas próximas eleições) – Intervenção popular democrática. | A Lava Jato (1ª instância, STF, TSE) aniquilarão algumas lideranças políticas corruptas (de vários partidos). Outras devem ser objeto do “voto faxina”. A população tem que completar o trabalho da Lava Jato. Vamos dizer não ao voto nulo, ao voto em branco e à abstenção. Sim, ao voto faxina. |
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