Por Dr. Carlo Crivellaro, Pediatra com Título de Especialista em Pediatria pela Sociedade Brasileira de Pediatria; Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria; e Membro da Highway to Health International Healthcare Community
Com certeza, esse é um tema muito delicado e difícil de ser falado, em qualquer época da nossa vida, e com qualquer pessoa.
Se é difícil para nós, adultos, imagine para as crianças. Como toda nova experiência, pode ser bastante confuso e assustador para as crianças, ainda mais em caso de morte por acidente. Quando acontece, seja ela com o bichinho de estimação ou com um ente querido, as crianças precisam de todo nosso apoio e, principalmente, de nossa sinceridade, para que haja confiança.
Antes de começar a explicar, temos que ter claro em nossa mente o que é a morte para nós mesmos, e pensar em que realmente acreditamos, porque só assim poderemos responder aos questionamentos delas, que vão ser muitos. Se quiser, vale explicar também que nem todos pensam exatamente como o papai e a mamãe, e dar versões de outras religiões.
Devemos entender também que o luto é um processo, e não um evento. Isso quer dizer que demanda tempo, e cada criança precisará de um tempo diferente para superar sua perda. Pressionar a criança a voltar a ter “vida normal”, sem dar o tempo necessário, implicará em outros problemas ou reações negativas.
Muitos pais têm dúvida de quando começar a falar sobre o assunto ou então preferem nem falar. Deixar de falar não é a melhor solução, pois a morte é algo que faz parte da vida de todos nós. Ela está nas plantas, nos bichinhos, nos amigos e familiares. A melhor época para falar sobre o assunto é quando a situação acontecer, e essa situação pode ser a morte de alguém querido ou o questionamento da criança sobre o porquê a florzinha do vaso morreu. A criança não irá se beneficiar de “não tocar no assunto” ou “tirar isso da cabeça”. Nunca fuja do assunto quando a criança quiser conversar sobre o tema.
Entre 5 a 7 anos, a criança começa a entender melhor como relacionar sua vida com o mundo. Então, automaticamente, ela conseguirá relacionar a morte com algo que ela perdeu, como um brinquedo, por exemplo.
A morte faz parte do ciclo da vida. Uma ótima maneira de preparar seu filho de maneira simples é ensiná-lo desde pequeno com exemplos práticos. Plante uma semente e vá mostrando como ela nasce, cresce e morre. Lembra daquele feijãozinho plantado no algodão que todos nós fizemos na escola? Pode ser um ótimo aliado neste momento. O mais importante desta experiência é mostrar que esse processo é natural e que independe de ele ter cuidado direitinho da planta.
Há três itens em relação à morte que a criança precisa entender:
- Tudo que é vivo vai morrer um dia;
- Quando morre não volta mais;
- Depois que morre, o morto não sente dor, não corre, não sente medo, não dorme, não pensa, não age mais.
Crianças até 3 anos não conseguem perceber claramente isso, mas entendem que não brincarão mais com a tia, ou que o avô não a buscará mais na escola. As mais velhas percebem que a morte é algo natural, mas precisarão de explicações concretas para entendê-la. Só a partir de 12 anos é que a criança consegue entender completamente todo o processo.
Nunca associe morte com sono! Para contar à criança que alguém morreu, o melhor é não mentir e nem contar historinhas do tipo: “ele dormiu para sempre”, “descansou”, ou “fez uma longa viagem”. As crianças entendem as frases exatamente como são ditas, e isso pode causar confusão na cabecinha delas. Podem achar que a vovó que morreu está apenas dormindo e vai acordar a qualquer momento e chegar em casa, ou que todo mundo que viaja nunca mais volta, ou quando o papai chegar e disser que está cansado, ela vai achar que ele vai dormir e morrer. Aliás, a própria criança pode começar a ter medo de dormir e não acordar mais. Se disser que “fulano virou uma estrelinha”, a criança vai acreditar e, quando olhar para o céu, irá achar que todas as estrelas são pessoas mortas.
Se um ente querido estiver muito doente a criança deve saber o que está acontecendo. Por mais nova que ela seja, irá perceber o clima da casa. Explique que a pessoa está doente e que é grave. Se caso a pessoa morrer, nunca chegue para a criança contando o que aconteceu de repente. Comece a conversa relembrando do ciclo da vida da plantinha, daquele feijãozinho que vocês plantaram. Encare como uma discussão em aberto, e não como um discurso! Dê espaço para a criança tirar as suas dúvidas. Comece com fatos básicos, descubra o que a criança sabe e pensa, para decidir o quanto mais de informação ela tolera. Nem todas as crianças suportam muitos detalhes. Mais uma vez: a criança precisa de apoio e sinceridade.
Nunca esconda seus sentimentos. Não queira passar a imagem de que está tudo bem. Ao contrário, exponha suas emoções, pode chorar e dizer que será difícil para todos da família. Isso fará a criança perceber que o que ela está sentindo é normal. Demonstre que, como a criança, você também sente saudades e está sofrendo, e deixe que ela fale sobre os seus sentimentos. Garanta que ela não está sozinha, e sempre haverá alguém para cuidar dela, principalmente se a perda for de um dos pais. E tenha paciência, pois é possível que ela pergunte as mesmas coisas várias vezes.
É natural que a criança apresente mudanças de comportamento após a notícia da morte de alguém com quem convive. Além do choro e da raiva, pode começar a ir mal na escola, ficar hiperativo ou fazer xixi na cama. Considere ajuda da escola e até de um psicólogo. É importante que a criança sinta que tem apoio e atenção também dos colegas e professores.
Outra dúvida comum é se a criança deve ir a velórios ou enterros. Não se deve forçar, mas a criança pode se beneficiar de participar junto com os adultos. Os rituais servem para que todos vivenciem melhor a despedida, inclusive os pequenos. Os especialistas concordam que velórios e enterros não traumatizam as crianças. Explique muito bem antes como é o velório ou o enterro, e pergunte se ela quer ir. A criança precisa saber antes que será triste, e que muitas pessoas estarão chorando. Não decida pela criança que ela deve ficar de fora, mas também não a obrigue a ir se ela não quiser, e não deixe que se sinta culpada se não for.
O mais importante de tudo é sempre agir com honestidade, com a verdade, para que seu filho possa sempre confiar em você. Se não souber responder a alguma pergunta, não tem nenhum problema em dizer “não sei”. Buscar as respostas junto com seu filho poderá uni-los ainda mais. Quando procurar ajuda profissional? Em casos de raiva ou hostilidade excessivas, ou quando a criança não expressa nenhum luto, ou em casos de depressão ou ansiedade que interferem nas atividades diárias, durando semanas ou meses.