NOTA CIENTÍFICA
Revista Brasileira de Biociências, Porto Alegre, v. 5, supl. 1, p. 399-401, jul. 2007
Introdução
A fitoterapia constitui uma forma de terapia
medicinal que vem crescendo rapidamente nestes últimos
anos [1].
Desde 1978, a Organização Mundial de Saúde
(OMS) incentiva os investimentos públicos em plantas
medicinais, devido aos altos preços dos produtos
sintéticos, e estima que o consumo de remédios à base de
ervas e plantas medicinais é prática comum para cerca de
80% da população mundial, segundo Simões et al. [2].
A aplicação caseira das plantas medicinais é feita na
elaboração de produtos para uso interno (na forma de
chás, xaropes, tinturas) [3,4]; e externo (emplastos,
cosméticos, banhos), também na forma de óleos de
massagem e aromaterapia. Para produção desses
medicamentos, são utilizadas uma ou mais partes das
plantas.
Entretanto, algumas plantas produzem princípios
ativos medicinais em determinados órgãos e substâncias
tóxicas em outros [4].
No mercado brasileiro é possível comprar livremente,
independente de receita médica, medicamentos rotulados
como fitoterápicos e ditos milagrosos, que geralmente
são produzidos por indústrias sem registro no Ministério
da Saúde ou conhecimento da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (ANVISA).
Esses medicamentos
não oferecem garantia de procedência da matéria-prima e
muitas vezes são colocados no mercado sem passar por
testes de comprovação dos efeitos terapêuticos e
toxicológicos, conforme Simões et al. [2].
Segundo Panizza [5], outra vantagem em comprar
medicamento fitoterápico industrializado é que o
consumidor tomará um xarope, ou qualquer outro tipo de
medicamento, feito da forma e com a quantidade
adequada da erva, o que já é mais difícil ocorrer se o
mesmo for feito da maneira caseira.
Esses fatores, aliados à falta de conhecimento técnico
da população representam grande risco à saúde dos
usuários, seja por seu uso excessivo ou incorreto. É
importante desmistificar a crença de que tudo que é
natural pode ser consumido à vontade. Segundo Lima &
Ferraz [4], como qualquer medicamento, aqueles feitos
de plantas medicinais podem trazer riscos sérios ao
organismo humano.
O presente trabalho teve como objetivo geral avaliar o
conhecimento e fontes de informação dos estudantes das
diferentes áreas de ensino do UnilesteMG sobre as
propriedades das plantas medicinais.
Material e métodos
A. Coleta de dados
Foram entrevistados estudantes de todos os cursos
superiores oferecidos pela instituição.
A aplicação dos
questionários foi feita de forma aleatória, buscando
entrevistar o maior número de universitários
matriculados nos diversos cursos oferecidos pela
instituição.
B. Cuidados éticos
Os dados dos participantes serão mantidos em sigilo,
respeitando este e os demais itens da resolução nº196/96
do Conselho Nacional de Saúde. Antes da aplicação dos
questionários, os entrevistados assinaram um Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido, contendo
informações sobre sua participação voluntária e demais
dados sobre a pesquisa.
Resultados
No total foram distribuídos 400 questionários. A
amostra obtida (n=310) permitiu estimar a aceitação dos
alunos em participar voluntariamente da pesquisa em
78%, em relação ao total de abordagens.
A. Sobre o conhecimento das propriedades das plantas
A análise dos dados revelou que 79% dos participantes
relataram já ter utilizado plantas medicinais, porém,
apenas 35% do total de alunos dessa instituição que
participaram dessa pesquisa têm conhecimento de que
muitas plantas podem causar danos à saúde humana
quando usadas de forma inadequada, contra 56% que não
acreditam nessa afirmação. Nessa questão, houve
equilíbrio apenas entre os entrevistados dos cursos da
área da saúde. A Tabela 1 mostra esses valores separados
por áreas do conhecimento.
B. Sobre as fontes de informação
Na questão sobre a fonte de informação sobre
produtos, os entrevistados tinham a possibilidade de
assinalar mais de uma opção. Nos 310 questionários
foram contabilizadas 618 respostas.
As opções mais
assinaladas foram: “pais e avós”, com 32% das respostas
e em seguida, “amigos e vizinhos”, com 15%.
A opção “médicos e farmacêuticos” apareceu em 12%
Avaliação do Conhecimento sobre as Plantas
Medicinais entre os Estudantes do Unileste, MG
Ana Cristina Magalhães de França1
, Ariane Cristine Araújo Silva2
, Pauline Reggiane Silveira2
,
Alice Pita-Barbosa2
, Richard Costa Barbosa2
e Carla de Arêdes Brum3
________________
1. Aluna de Graduação do Curso de Ciências Biológicas e Bolsista do Programa de Iniciação Científica (PIC) do Centro Universitário do Leste de
Minas Gerais (UnilesteMG). Av. Tancredo Neves, 3500 – Bairro Universitário, Coronel Fabriciano, MG, CEP 35170-056. E-mail:
acmfranca@hotmail.com.br
2. Aluno(a) de Graduação do Curso de Ciências Biológicas e Colaborador(a) do Programa de Iniciação Científica (PIC) do Centro Universitário do
Leste de Minas Gerais (UnilesteMG). Av. Tancredo Neves, 3500 – Bairro Universitário, Coronel Fabriciano, MG, CEP 35170-056.
3. Professora do Curso de Ciências Biológicas e Orientadora do Programa de Iniciação Científica (PIC) do Centro Universitário do Leste de Minas
Gerais (UnilesteMG). Av. Tancredo Neves, 3500 – Bairro Universitário, Coronel Fabriciano, MG, CEP 35170-056.
Apoio financeiro: UnilesteMG e Fundação Geraldo Perlingeiro de Abreu (FGPA).
Revista Brasileira de Biociências, Porto Alegre, v. 5, supl. 1, p. 399-401, jul. 2007
400
das respostas, enquanto “Balconistas de lojas e
farmácias” obteve um percentual de 4% como fonte de
informação.
Do total de respostas, 5% eram referentes à
obtenção de informações sobre plantas medicinais e
fitoterápicos através de comerciais veiculados em
televisão e, também, 5% através de programas
documentários.
A Internet e literatura especializada foram citadas em
6% e 7%, respectivamente, das respostas. Comerciais
veiculados em jornais e revistas, consulta em livros
populares e indicações de raizeiros foram citadas por 6%,
3% e 2%, nessa ordem. A questão foi deixada em branco
em 18 questionários, representando 3% do total. A
relação com o número de citações para essa questão
aparece na Figura 1.
Apenas 16% dos entrevistados afirmam que sempre
buscam informações científicas sobre a eficácia das
plantas e produtos que costumam utilizar; 48% raramente
buscam tais informações, 34% responderam que nunca
fizeram esse tipo de pesquisa, 2% dos entrevistados não
responderam a essa questão. A relação com o número de
citações para essas questões aparece na Figura 2.
C. Sobre os medicamentos naturais industrializados
Sobre a aquisição de medicamentos naturais
industrializados, 51% dos entrevistados responderam que
compram em farmácias, 12% em supermercados, 3%
através de revistas e 24% dos entrevistados afirmam não
utilizar esse tipo de produto.
Foram feitas duas citações
de compra através da internet e em 30 questionários essa
pergunta foi deixada em branco, representando 9% do
total.
Para esse grupo, também foi perguntado se costumam
ler as informações contidas em embalagens, rótulos e
bulas dos mesmos, onde 75% afirmaram verificar e 15%
dos entrevistados não costumam ler as informações. Essa
pergunta não foi respondida por 10% dos entrevistados.
Para os entrevistados que verificam as informações
dadas pelos fabricantes nas embalagens e rótulos, um
quadro foi montado com as informações mais freqüentes
encontradas nas embalagens e bulas, onde 68%
costumam verificar a data de fabricação dos produtos,
87% conferem o prazo de validade, 53% a composição,
63% a indicação, 67% as contra-indicações, 66% a
dosagem recomendada, 64% as reações adversas, 27%
verificam a procedência do produto e apenas 23% dos
participantes costumam verificar se o produto possui
registro junto ao Ministério da Saúde ou se são do
conhecimento da ANVISA.
Discussão
O presente trabalho mostrou também que 55% dos
entrevistados adquirem medicamentos naturais em
farmácias, muitas vezes, sem indicação profissional, o
que pode caracterizar a prática da automedicação. Em
pesquisa sobre o consumo de produtos vitamínicos entre
universitários, Santos & Barros-Filho [6] constatam que
a ação de balconistas de farmácias pode contribuir para
essa prática.
Outro fator que pode contribuir para a automedicação
é o tipo de publicidade, em torno de produtos elaborados
a partir de compostos naturais, veiculada nos diversos
meios de comunicação.
Analisando a publicidade de medicamentos veiculada
em emissoras de rádios do Rio Grande do Sul, Heineck
et al. [7] verificaram que a mais de 80% das propagandas
não apresentam informações importantes, como a
composição, posologia e o laboratório fabricante.
E
ainda, que muitas das propagandas enfatizam a ausência
de quaisquer riscos, mediante declarações como “Não
tem contra-indicações”, caracterizando a indução ao uso
indiscriminado. Sendo os medicamentos promovidos
como produtos quaisquer, omitindo-se informações
fundamentais a respeito de cuidados, reações adversas e
contra-indicações.
Foram oferecidas onze opções de fontes de
informação, sendo que mais da metade dos entrevistados
buscam informações sobre plantas medicinais através de
conversas com seus “pais e avós” e em seguida aparece a
opção “amigos e vizinhos”, demonstrando que o hábito
do consumo de fitoterápicos está ligado à tradição
familiar e à cultura popular.
Os estudos realizados ao longo dos anos sobre as
propriedades das plantas medicinais, seus efeitos
terapêuticos e toxicológicos mostram que muitas plantas
podem causar danos à saúde humana quando usadas de
forma inadequada [4].
Embora os entrevistados sejam
universitários com amplo acesso a informação, poucos
entrevistados possuem o hábito de pesquisar a existência
de comprovação científica sobre a eficácia dos produtos
que costumam utilizar.
Mais da metade dos participantes costumam comprar
medicamento natural industrializado, sendo essa a
preferência de 30% dos entrevistados.
Entre os usuários de medicamento natural
industrializado, poucos entrevistados verificam a
procedência do produto e é ainda menor o número de
participantes que costumam verificar se o produto possui
registro junto ao Ministério da Saúde ou se são do
conhecimento da ANVISA, sendo que grande parte dos
produtos oferecida no mercado atualmente não recebeu o
consentimento para comercialização desses órgãos de
fiscalização, podendo oferecer riscos à saúde dos
usuários, por não se conhecer a idoneidade dos mesmos.
Agradecimentos
Ao UnilesteMG e à Fundação Geraldo Perlingeiro de
Abreu – FGPA, pelo apoio financeiro à realização deste
estudo.
Ao Programa de Iniciação Científica – PIC, pelo
apoio e incentivo ao reconhecimento científico. Aos
estudantes do UnilesteMG, que gentilmente, aceitaram
participar das entrevistas.
Referências
[1] YUNES, R.A., PEDROSA, R.C. & CECHINEL FILHO, V. 2001.
Fármacos e fitoterápicos: a necessidade do desenvolvimento da
indústria de fitoterápicos e fitofármacos no Brasil. – Quím. Nova,
jan./fev., vol.24, n.1, p.147–152. ISSN 0100-4042.
[2] SIMÕES, C.M.O. [et al.]. 2003. Farmacognosia: da planta ao
medicamento. 5ª ed. rev. ampl. – Porto Alegre/Florianópolis:
UFRGS/UFSC.
[3] SANTOS, M.G.; DIAS, A.G.P. & MARTINS, M.M. 1995.
Conhecimento e uso da medicina alternativa entre alunos e
professores de primeiro grau. – Rev. Saúde Pública, jun., vol.29,
no.3, p.221–227. ISSN 0034-8910.
Revista Brasileira de Biociências, Porto Alegre, v. 5, supl. 1, p. 399-401, jul. 2007
401
[4] LIMA, V.C. & FERRAZ, E.B. 2002. Uso de plantas medicinais:
da poesia à tradição.– IPA – Empresa Pernambucana de Pesquisa
Agropecuária (IPA – Documentos, 28). Recife: IPA, 2002. 59p.
[5] PANIZZA, S. 2004. Cheiro de Mato – In: Revista Geração
Saúde: Plantas & Ervas. – São Paulo: Minuano, Ano II, nº 11, p.
6–8.
[6] SANTOS, K.M.O. & BARROS-FILHO, A.A. 2002. Consumo de
produtos vitamínicos entre universitários de São Paulo, SP. Rev.
Saúde Pública, abr., vol.36, no.2, p.250-253. ISSN 0034-8910.
[7] HEINECK, I.; GALLINA, S.M.; SILVA, T. [et al.]. 1998.
Análise da publicidade de medicamentos veiculada em emissoras
de rádio do Rio Grande do Sul, Brasil. Cad. Saúde Pública,
jan./mar., vol.14, no.1, p.193-198. ISSN 0102-311X.
Tabela 1. Relação do número e percentual (%) de entrevistados de acordo com a área do conhecimento em relação ao conhecimento
e uso de plantas medicinais.
Área do
conhecimento
Total de
entrevistados
por área
Já utilizaram plantas
medicinais
Sabem dos riscos do uso
inadequado de plantas medicinais
Sim
(%)
Não
(%)
Branco
(%)
Sim
(%)
Não
(%)
Branco
(%)
Ciências Exatas 76 58 18 - 48 28 -
(76) (24) - (63) (37) -
Ciências da Educação 36 27 8 1 21 13 2
(75) (22) (3) (58) (36) (6)
Ciências da Saúde 146 119 25 2 72 71 3
(82) (17) (1) (49) (49) (2)
Ciências Sociais 52 33 17 2 37 14 1
(63) (33) (4) (71) (27) (2)
198
90
14 22
38
20
46
30 28
74
40
18
0
50
100
150
200
250
Nº de citações
Pais e avós
Amigos e vizinhos
Raizeiros
Balconistas
Jornais e revistas
Livros populares
Livros especializados
TV - comerciais
TV - documentários
Médicos e farmacêuticos
Internet
Branco
Figura 1. Relação do número citações quanto à principal fonte de informação sobre as plantas medicinais.
106
148
50
6
0
20
40
60
80
100
120
140
160
Nº de citações
Nunca pesquisaram
Raramente
pesquisam
Sempre pesquisam
Branco
Figura 2. Relação do número citações de pesquisa sobre comprovação científica das plantas medicinais utilizadas pelos
entrevistados.
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